quarta-feira, 12 de setembro de 2012

A Missão do Ateliê

Eu morava em Salvador quando vi pela primeira vez uma colcha em patchwork - ao vivo, em cores, na minha frente! Lembro até hoje de minha reação; não dava para acreditar que um ser humano "normal" tinha feito aquilo. Devia ser trabalho de uma fada.

Hoje, anos depois, como professora minha principal missão é provar às pessoas que não é preciso ter poderes de fada para fazer patchwork. É preciso ter capricho, boa vontade e conhecer as técnicas. E praticar. Qualquer pessoa pode fazer.

Não falo só de minhas alunas. Aqui na cidade todo ano o ateliê organiza uma mostra de patchwork - em outubro estrearemos a quarta exposição. No ano passado montamos uma sala de costura em plena galeria, e todos os dias houve demonstrações de técnicas diversas. No final da mostra montei esta peça com os blocos costurados ao longo de todas as demonstrações:

Manta de bebê confecionada durante a 3ª Mostra de Patchwork de Pouso Alegre (2011), na presença dos visitantes, e doada como prenda para o Bingo Anual da Creche do Foch (edição 2012).

Blocos confeccionados durante a exposição.

Outra missão importante do ateliê é desmistificar o patchwork como artesanato caro. A técnica anda em alta nos últimos anos, e com isso surgiram no mercado muitos diferentes tipos de acessórios e equipamentos, além de distribuidores de tecidos que investem no design de lindas estampas coordenadas. No entanto, é preciso lembrar a origem do patchwork: ele surgiu como forma de economizar, de aproveitar o que estava sobrando. Já contei um pouco sobre a história da evolução do patchwork em meu blog "Falando de Fibras" - nessa postagem. Na mesma ocasião mostrei como hoje há um setor do comércio que "pausteriza" o patchwork: vende kits para confeccionar peças, compostos por apostila com instruções e tecidos coordenados, já na quantidade certinha para aquele projeto. 

Sou um pouco contra esses kits; eles são práticos, massssss:

- são caros!
- as peças normalmente são pobres em design, pouco criativas: as estampas empregadas são maravilhosas, mas o patchwork em si é super básico; exemplo: 

Kit vendido em uma loja virtual americana: custa 99 dólares e inclui material para confecção do topo apenas - manta acrílica e forro não estão incluídos. Os design é extramamente simples - composto apenas por quadrados e retângulos.

- Um kit pronto é extremamentente conveniente: você não precisa combinar os tecidos, calcular nada, planejar, tomar decisões... Opa! Peraí: mas a idéia não é essa? 

Vamos refletir: a gente faz artesanato por três motivos, basicamente:

     1. ...porque a gente cobiça a peça resultante - é algo que queremos usar, ter em casa ou dar de presente;
     2. ...porque a gente curte o processo: desde o planejamento, a escolha carinhosa dos materiais, a confecção, o acabamento...
     3. ...porque a gente deseja ter uma peça única, exclusiva, com a própria "cara", que em nenhum lugar do mundo existirá igual.

Pois é. Essa idéia aparentemente moderna, prática e conveniente de se fabricar e vender tecidos já coordenados, combinados e calculados, parece satisfazer bem ao item número um acima: conseguimos finalizar uma peça em menos tempo, sem muito trabalho e sem grandes riscos. Mas quanto aos itens dois e três, eu diria que grande parte do prazer de confeccioná-la nos é roubado; e nunca teremos uma peça exclusiva.

Dentro desse raciocínio eu diria que a principal missão do ateliê é dar às alunas autonomia: para confeccionar uma peça em patchwork, é preciso uma receita: ela inclui o planejamento do design e dos tamanhos, a escolha dos tecidos e uma lista de corte - os "ingredientes". Nós podemos nunca criar as  receitas; podemos fazer lindas peças seguindo as instruções em livros e revistas. Mas nunca estaremos exercendo a criatividade que todo ser humano tem. Ou podemos aprender a combinar nossos próprios ingredientes, buscar inspiração, olhar a nossa volta à procura de temas... e confeccionar peças únicas! Isso é autonomia.

O ateliê Baú da Cotinha vai sempre encorajar as alunas e ensinar-lhes o necessário para que valorizem o processo e tenham autonomia. Nas próximas postagens mostrarei como. 

Até lá!

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